Volver a Índice

Capítulo 4

Biomarcadores na distrofia muscular de Duchenne

ALÉM DA CREATINA QUINASE, EXISTEM OUTROS BIOMARCADORES SÉRICOS NA DISTROFIA MUSCULAR DE DUCHENNE?

C. Jiménez Mallebrera

Sim, a identificação e validação de biomarcadores séricos para a DMD é um campo de investigação muito ativo e existem numerosos estudos. No entanto, os resultados dos vários estudos nem sempre coincidem. Por exemplo, o mesmo biomarcador pode ser encontrado aumentado num estudo, mas diminuído ou inalterado noutro. Isso deve-se principalmente às caraterísticas do grupo de doentes analisado (idade, estágio da doença, estado funcional, etc.), às condições de colheita e armazenamento das amostras e à técnica utilizada para a determinação do biomarcador. Além disso, são frequentemente encontradas diferenças entre amostras de origem humana e amostras de modelos animais e, por essa razão, alguns biomarcadores não são validados nos doentes. Por todas estas razões, é importante compreender a biologia relacionada com o biomarcador no contexto da doença e utilizar sempre protocolos normalizados e validados1.

A tabela 1 contém uma seleção dos biomarcadores séricos descritos para a DMD, para os quais existem várias evidências, em doentes (e não apenas em modelos animais), da sua potencial utilidade como biomarcadores de diagnóstico e que correspondem a proteínas ou metabolitos e a microRNA (miRNA)2-15. Todos estes biomarcadores são de diagnóstico porque discriminam doentes com DMD e indivíduos saudáveis, e a maioria deles também pode discriminar doentes com distrofia muscular de Duchenne e de Becker. No entanto, o seu valor como biomarcadores de prognóstico da evolução da doença ainda não foi suficientemente demonstrado.

Tabela 1. Seleção de biomarcadores circulantes (proteínas, metabolitos e miRNA) cuja concentração está alterada em doentes com DMD ( aumentado,  diminuído), indicando se também estão alterados em algum dos modelos animais de DMD

Proteína/miRNA

Modelo animal

Referência

MMP-9 (matrix metalloproteinase 9)

Rato mdx

Nadarajah, et al. 20116
e Anaya-Segura, et al. 20157

TIMP-1 (tissue inhibitor of metalloproteinases 1)

Rato mdx

Anaya-Segura, et al. 20157

GDF-8 (fator de crescimento e diferenciação 8)

Anaya-Segura, et al. 20157

FSTN (folistatina)

Anaya-Segura, et al. 20157

MYL3 (myosin light chain 3)

Rato mdx / Golden Retriever GRMD

Burch, et al. 20158 e Ayoglu, et al. 20149

FABP3 (fatty acid binding protein 3)

Rato mdx / Golden Retriever GRMD

Burch, et al. 20158

CKM (creatine kinase-m type)

Rato mdx / Golden Retriever GRMD

Burch, et al. 20158

CA3 (anidrase carbónica III)

Ayoglu, et al. 20149

MDH2 (malate dehydrogenase 3)

Ayoglu, et al. 20149

ETFA (flavoproteína transportadora de eletrões subunidade alfa)

Ayoglu, et al. 20149

MYOM3 (myomesin 3)

Rato mdx/Golden Retriever GRMD

Rouillon, et al. 201510

Creatina

Spitali, et al. 201811

Creatina/creatinina

Spitali, et al. 201811

miR-1

Zaharieva, et al. 201312 e Cacchiarelli, et al. 201113

miR-133a

Zaharieva, et al. 201312 e Cacchiarelli, et al. 201113

miR-133b

Zaharieva, et al. 201312 e Cacchiarelli, et al. 201113

miR-206

Zaharieva, et al. 201312 e Cacchiarelli, et al. 201113

miR-483

Coenen-Stass, et al. 201814

miR-30c

Paco, et al. 20154; Llano-Diez, et al. 20175 e Trifunov, et al. 202015

miR-181a

Paco, et al. 20154; Llano-Diez, et al. 20175 e Trifunov, et al. 202015

QUAL É O FUTURO DOS BIOMARCADORES NA DMD?

C. Jiménez Mallebrera

Os biomarcadores moleculares têm várias vantagens em relação às variáveis clínicas, uma vez que estas últimas dependem, em grande parte, da motivação do doente, existe muita variabilidade entre os indivíduos e as mudanças naquelas são lentas, enquanto os biomarcadores podem ser medidos de forma objetiva, são mais dinâmicos e respondem mais rapidamente às mudanças resultantes, por exemplo, da evolução e tratamento da doença1. O principal desafio é, por um lado, investigar com maior profundidade e mais sistematicamente se algum dos biomarcadores de diagnóstico já descritos têm um possível papel como biomarcadores de prognóstico; e, por outro lado, identificar e validar potenciais biomarcadores terapêuticos e farmacodinâmicos não-invasivos que permitam prever e monitorizar, de forma individualizada, a resposta dos doentes às terapias atuais e futuras, melhorar o desenho dos ensaios clínicos e otimizar a implementação dos tratamentos e o seu impacto nos sistemas de saúde (por exemplo, para informar os médicos no momento de avaliar os ensaios em que os doentes participarão e o melhor tratamento a prescrever). Para tal, é necessário compreender melhor a natureza biológica dos diferentes biomarcadores e a sua relação com a patologia. Por exemplo, os RNA não-codificadores (tanto os miRNA como os RNA não-codificadores longos ou lncRNA) são uma classe promissora de biomarcadores porque são estáveis na circulação e podem ser medidos com técnicas relativamente simples, mas ainda não sabemos a origem dessas moléculas na circulação e a razão da sua estabilidade. As vesículas extracelulares, como os exossomas e as microvesículas, representam uma fonte muito valiosa de biomarcadores moleculares circulantes (incluindo os miRNA, os lncRNA e as proteínas), pois protegem o seu conteúdo da degradação e são o resultado de uma secreção dirigida que reflete o estado patológico da célula de origem16, embora esta seja uma área ainda pouco investigada no contexto das distrofias musculares. Uma limitação é que diferentes técnicas de isolamento das vesículas extracelulares produzem populações diferentes e, portanto, seria necessária uma padronização das técnicas de isolamento e caraterização. Por último, é muito provável que o uso combinado de vários biomarcadores seja mais eficaz do que o uso de biomarcadores individuais, e que a utilização de algoritmos matemáticos e inteligência artificial desempenhe um papel importante na determinação e interpretação desses painéis de biomarcadores.

BIBLIOGRAFIA

1. FDA-NIH Biomarker Working Group. BEST (Biomarkers, EndpointS, and other Tools) Resource [Internet]. EE.UU.: Food and Drug Administration, National Institutes of Health; 2016. Disponible en: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK326791/

2. Szigyarto CA, Spitali P. Biomarkers of Duchenne muscular dystrophy: current findings. Degener Neurol Neuromuscul Dis. 2018;25;8:1-13.

3. Koutsoulidou A, Phylactou LA. Circulating biomarkers in muscular distrophies: disease and therapy monitoring. Mol Ther Methods Clin Dev. 2020;18:230-9.

4. Paco S, Casserras T, Rodríguez MA, Jou C, Puigdelloses M, Ortez CI, et al. Transcriptome analysis of Ullrich congenital muscular dystrophy fibroblasts reveals a disease extracellular matrix signature and key molecular regulators. PLoS One. 2015;10(12):e0145107.

5. Llano-Diez M, Ortez CI, Armas Gay J, Álvarez-Cabado L, Jou C, Medina J, et al. Digital PCR quantification of miR-30c and miR-181a as serum biomarkers for Duchenne muscular dystrophy. Neuromuscul Disord. 2017;27(1):15-23.

6. Nadarajah VD, van Putten M, Chaouch A, Garrood P, Straub V, Lochmüller H, et al. Serum matrix metalloproteinase-9 (MMP-9) as a biomarker for monitoring disease progression in Duchenne muscular dystrophy (DMD). Neuromuscul Disord. 2011;21:569-78.

7. Anaya-Segura MA, García-Martínez FA, Montes-Almanza LA, Díaz BG, Avila-Ramírez G, Alvarez-Maya I, et al. Non-invasive biomarkers for Duchenne muscular dystrophy and carrier detection. Molecules. 2015;20(6):11154-72.

8. Burch PM, Pogoryelova O, Goldstein R, Bennett D, Guglieri M, Straub V, et al. Muscle-derived proteins as serum biomarkers for monitoring disease progression in three forms of muscular dystrophy. J Neuromuscul Dis. 2015;2(3):241-55.

9. Ayoglu B, Chaouch A, Lochmüller H, Politano L, Bertini E, Spitali P, et al. Affinity proteomics within rare diseases: a BIO-NMD study for blood biomarkers of muscular dystrophies. EMBO Mol Med. 2014;6:918-36.

10. Rouillon J, Poupiot J, Zocevic A, Amor F, Léger T, Garcia C, et al. Serum proteomic profiling reveals fragments of MYOM3 as potential biomarkers for monitoring the outcome of therapeutic interventions in muscular dystrophies. Hum Mol Genet. 2015;24:4916-32.

11. Spitali P, Hettne K, Tsonaka R, Sabir E, Seyer A, Hemerik JBA, et al. Cross-sectional serum metabolomic study of multiple forms of muscular dystrophy. J Cell Mol Med. 2018;22:2442-8.

12. Zaharieva IT, Calissano M, Scoto M, Preston M, Cirak S, Feng L, et al. Dystromirs as serum biomarkers for monitoring the disease severity in Duchenne muscular dystrophy. PLoS One. 2013;8(11):e80263.

13. Cacchiarelli D, Legnini I, Martone J, Cazzella V, D’Amico A, Bertini E, et al. miRNAs as serum biomarkers for Duchenne muscular dystrophy. EMBO Mol Med. 2011;3(5):258-65.

14. Coenen-Stass AML, Sork H, Gatto S, Godfrey C, Bhomra A, Krjutškov K, et al. Comprehensive RNA-sequencing analysis in serum and muscle reveals novel small RNA signatures with biomarker potential for DMD. Mol Ther Nucleic Acids. 2018;13:1-15.

15. Trifunov S, Natera-de Benito D, Exposito Escudero JM, Ortez C, Medina J, Cuadras D, et al. Longitudinal study of three microRNAs in Duchenne muscular dystrophy and Becker muscular dystrophy. Front Neurol. 2020;11:304.

16. Catapano F, Scaglioni D, Maresh K, Ala P, Domingos J, Selby V, et al. Novel free-circulating and extracellular vesicle-derived miRNAs dysregulated in Duchenne muscular dystrophy. Epigenomics. 2020;12(21):1899-915.