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Capítulo 2

Biopsia muscular

QUAIS SÃO AS CARATERÍSTICAS DA BIOPSIA MUSCULAR NA DISTROFIA MUSCULAR DUCHENNE/ DISTROFIA MUSCULAR DE BECKER E QUAL A SUA UTILIDADE NOS DIAS DE HOJE?

C. Jou Muñoz

A biopsia muscular tem sido a principal forma de diagnóstico em doentes com DMD/DMB. No microscópio ótico, veremos um padrão distrófico caraterizado pela desestruturação da arquitetura muscular, com perda de fibras musculares e a presença de necrose e fibrose. Uma caraterística constante é a presença de fibrose endomisial que, em estágios iniciais, será leve, mas à medida que a doença progride, o tecido conjuntivo envolverá as fibras musculares e estender-se-á até ao perimísio juntamente com o tecido adiposo1.

A análise das proteínas da membrana sarcoplasmática por imuno-histoquímica é essencial para se chegar a um diagnóstico conclusivo. No caso da DMD/DMB, temos três anticorpos contra diferentes regiões da distrofina: amino-terminal (DYS3, exão 10-12), região central da proteína (DYS1, exão 31) e carboxi-terminal (DYS2, últimos 17 aminoácidos). Na DMD, não existe imunocoloração dos três anticorpos ou presença de vestígios em fibras ocasionais, podendo observar-se positividade nas fibras revertíveis, sendo estas menos de 1%. Na DMB, observaremos imunocoloração desigual, com redução de intensidade ou presença de fibras isoladas negativas distribuídas de forma aleatória. Nestes casos, o imunoblot pode ser útil para analisar a quantidade de proteína e o seu peso molecular. Outro anticorpo útil no diagnóstico da DMD/DMB é a utrofina, uma proteína sobre-expressa na membrana das fibras musculares de doentes com DMD/DMB, embora existam outras situações em que a utrofina está sobre-expressa, como nas fibras regenerativas, fibras musculares de doentes com outras distrofias das cinturas ou em miopatias inflamatórias. Deve-se notar que a redução da utrofina está relacionada com a idade, e os doentes com menos de dois anos podem ter uma expressão muito baixa de utrofina. Na DMD/DMB, podemos encontrar, em segundo lugar, uma redução de outras proteínas do complexo sarcolémico1-3.

Embora não seja possível diferenciar a DMD e DMB com base apenas nas alterações histológicas, na DMD vamos observar um maior grau de necrose ou fibras hialinas, enquanto na DMB a patologia pode ser mais ligeira.

O diagnóstico da DMD/DMB é atualmente feito por técnicas moleculares, mas a biopsia muscular continua a ser um método de diagnóstico útil em doentes com mutações pontuais ou mutações intrónicas que não são detetadas por análises moleculares-padrão. Outra utilidade que tem hoje em dia é a quantificação da proteína residual existente no tecido muscular, um biomarcador na monitorização dos ensaios clínicos que restabelece os níveis proteicos4.

A BIOPSIA MUSCULAR SERVE DE BIOMARCADOR DE PROGNÓSTICO DA DMD/DMB?

C. Jou Muñoz

O espetro de gravidade nos doentes com DMD e DMB é parcialmente determinado pela quantidade de distrofina presente nas fibras musculares, assim como pelas regiões funcionais de distrofina que foram eliminadas ou estão alteradas. Tal pode ser avaliado pela análise imuno-histoquímica da distrofina. Tem sido publicado que existe uma estreita correlação entre a quantidade de imunorreatividade para a distrofina e a gravidade do fenótipo clínico: doentes com DMB ligeira mostram maiores quantidades de distrofina do que aqueles com DMB grave, e estes mostram maiores quantidades de distrofina do que os doentes com DMD1,2.

Dependendo do estágio da doença, o número de fibras musculares degenerativas-regenerativas é variável, assim como o grau de necrose e de mialgia, embora a gravidade clínica nem sempre esteja correlacionada com o grau de patologia observado na biopsia muscular. Alterações patológicas têm sido descritas em doentes com alguns meses de idade, embora não apresentem qualquer sintoma clínico e apenas se observe uma subida da CK. Outro biomarcador de prognóstico é a fibrose, sobretudo a fibrose endomisial que envolve as fibras musculares, a qual está intimamente relacionada com a perda da função motora. Foi descrita uma correlação inversa entre os níveis de fibrose e a quantidade de utrofina e o número de fibras revertíveis, descobertas que significam uma relação entre síntese da utrofina e a fibrose; o aumento das fibras revertíveis e dos níveis de utrofina está relacionado com o aumento da função motora. A redução de outras proteínas do complexo DAG não parece estar associada ao prognóstico de doentes com DMD/DMB3,4.

BIBLIOGRAFIA

1. Dubowitz V, Sewry C, Oldfors A. Muscle biopsy: A practical approach. 4th Edition. Filadelfia: Saunders Elsevier; 2013.

2. Muntoni F, Mateddu A, Cianchetti C, Marrosu MG, Clerk A, Cau M, et al. Dystrophin analysis using a panel of anti-dystrophin antibodies in Duchenne and Becker muscular dystrophy. J Neurol Neurosurg Psychiatry. 1993;56(1):26-31.

3. Desguerre I, Mayer M, Leturcq F, Barbet JP, Gherardi RK, Christov C. Endomysal fibrosis in Duchenne muscular dystrophy: a marker of poor outcome associated with macrophage alternative activation. J Neuropathol Exp Neurol. 2009;68:762-73.

4. Levi O, Genin O, Angelini C, Halvey O, Pines M. Inhibition of muscle fibrosis results in increases in both utrophin levels and the number of revertant myofibers in Duchenne muscular dystrophy. Oncotarget. 2015;6(27):23249-60.